“Combinando ferramentas de gerenciamento de doenças com algoritmos preditivos e dados do mundo real, as empresas estão buscando em conjunto cuidados e pesquisas de forma proativa”, afirma Pamela Spence, líder global de Ciências da Saúde e Bem-Estar da EY.
Para a especialista, a revolução dos cuidados de saúde não é apenas uma oportunidade, mas uma necessidade urgente e essencial. “Nossos modelos de saúde não são sustentáveis a longo prazo. O custo dos gastos com saúde continua a aumentar com o rápido crescimento mundial de doenças crônicas dispendiosas. Enquanto isso, a força de trabalho global de saúde enfrenta um déficit previsto de 18 milhões de profissionais até 2030, uma lacuna que acelerará a adoção necessária de tecnologias digitais”, pontua.
Avanços Tecnológicos
Inovadores do setor da saúde estão trabalhando na integração de computação em nuvem, sensores, sistemas de realidade virtual e estendida e banda larga de quinta geração em modelos de prestação de cuidados. À medida que essas tecnologias continuam a evoluir e convergir no espaço da saúde, elas estão permitindo a criação de uma crescente Internet das Coisas Médicas (IoMT).
“O efeito real da IoMT será impulsionar um crescimento sem precedentes na quantidade e na qualidade dos dados de saúde disponíveis. Já estamos testemunhando um aumento exponencial nos dados de saúde, com bilhões de gigabytes de informações de pacientes sendo gerados dentro e fora dos sistemas de saúde todos os anos”, afirma Pamela.
O relatório mostra que, em um mundo cada vez mais conectado, quantidades crescentes de dados medida que aumenta o número de ferramentas de captura de dados, cresce também o volume de dados relativos a cada indivíduo. Para se ter uma ideia, mesmo com a distribuição desigual da tecnologia, cada pessoa no planeta gera, em média, mais de 50 terabytes de dados por ano. Embora apenas uma minoria seja diretamente de dados de saúde, até 80% dos resultados de saúde são moldados por dados não clínicos.
De acordo com Pamela Spence, a inteligência artificial oferece um meio de conectar, combinar e interrogar esses dados de maneira diferente. “A capacidade de avanço rápido da inteligência artificial para nos ajudar a sentir, perceber, aprender, saber, raciocinar, planejar e agir. Ou seja, uma combinação de humanos e máquinas oferece rotas para aumentar a inteligência somente humana em níveis inimagináveis em comparação com os dias de hoje.”
A nuvem de dados personalizada em torno de cada paciente será alimentada em uma camada de dados que permite que as informações de um paciente sejam comparadas com linhas de base individualizadas e com dados do mundo real em cortes de pacientes comparáveis. “O sistema pode começar a planejar intervenções direcionadas mais bem informadas e aprender com essas intervenções para refinar continuamente as abordagens de atendimento para cada paciente.”
Transformando o atendimento
Esse movimento promete uma revolução na forma como a assistência médica será operacionalizada no futuro. Quem concorda é o médico
cardiologista, cientista e empreendedor alemão Andreas Keck, especialista em tecnologias e inovação em saúde, que participou do lançamento da 5ª edição do Global Summit Telemedicine & Digital Health. O evento, realizado pela Associação Paulista de Medicina (APM), acontecerá esse ano de 20 a 22 de novembro, com o tema central “Saúde digital para todos”.
Keck é consultor de negócios internacionais para grandes organizações voltadas à saúde e pesquisador de tecnologias digitais inovadoras que estão sendo usadas globalmente, além de ter fundado várias empresas. Atualmente, está envolvido na pesquisa e na construção de companhias com base em algoritmos avançados de inteligência artificial, trabalhando com conjuntos de informações exclusivas, incluindo dados genéticos, clínicos, laboratoriais e eletrofisiológicos.
Segundo o executivo, a Europa é hoje a região com maiores investimentos ativos em todo o mundo quando o assunto são terapias digitais (DTx). Trata-se de um mercado que pode alcançar um volume de 4 bilhões de dólares até 2030. O aumento dos custos da saúde, tendo como principal impulsionador o custo com a adoção de tratamentos eficazes, emerge como um dos motivadores desse cenário, assim como a prevalência de doenças crônicas.
“São diversas as peças do quebra-cabeça, e existem novas perspectivas de adesão através da saúde digital. Os pacientes estão cada vez mais utilizando tecnologias que os apoiam na gestão de sua saúde, e como consumidores esperam serviços mais holísticos, desenvolvidos de acordo com suas necessidades. Há também a mudança de um cuidado centrado no tratamento para um cuidado centrado no paciente. Ao mesmo tempo, espera-se uma redução da hospitalização e um aumento de receitas. Tudo isso em um cenário com novas abordagens tecnológicas, como mHealth e IoT, e busca por personalização e incentivo ao tratamento”, explica.
Keck acrescenta que, em paralelo, aumentar a adesão e o uso adequado dos medicamentos pode ajudar as indústrias do setor farmacêutico a recuperar os bilhões em receita, reduzir a pressão no setor de saúde, fortalecer os contratos de pagamentos baseados em performance e valor, e gerar novas receitas através dos apps de prescrição.
Outras tecnologias também estão apoiando esse processo. É o caso dos assistentes digitais e os sistemas de suporte à decisão clínica, além da
inteligência artificial e do uso de algoritmos para solucionar diferentes desafios e analisar dados de prontuários eletrônicos, com destaque para a necessidade de combinar os insights da inteligência artificial (IA) com o profundo conhecimento dos profissionais médicos.
Poder dos dados
Como a inovação pode utilizar o poder dos dados para entregar cuidados baseados em valor? Para Pamela Spence, da EY, as organizações têm as ferramentas para oferecer uma melhor experiência de saúde personalizada, mas o ecossistema precisa colaborar para construir esse futuro. “O universo em expansão de sensores e a internet de coisas médicas, a explosão sem precedentes de dados de saúde e o poder em rápida expansão da Inteligência Artificial (IA) para transformar esses dados em insights são realidades agora. Se todo o potencial dessas e de muitas outras novas tecnologias for liberado, veremos um modelo de assistência à saúde irreconhecível do sistema que vemos hoje”, explica a executiva, citando o relatório “How you can jumpstart innovation to unlock the power for data to deliver value-based care”.
De acordo com a executiva, apesar do enorme potencial dessa visão, até o momento a indústria fez apenas um progresso limitado na jornada do sistema de saúde “analógico”, por meio de cuidados digitalizados e conectados, até o sistema de saúde verdadeiramente inteligente do futuro, o ecossistema de saúde inteligente. “Nessa abordagem de ecossistema, as inovações digitais se tornarão mais do que soluções pontuais autônomas, conectando-se a um sistema mais amplo e poderoso de atendimento baseado em dados e fornecido por tecnologia.”
Já para Luciane Infanti, sócia e líder da consultoria estratégica EY-Parthenon para a América do Sul, uma das jornadas do ecossistema de saúde é tirar a doença do centro de atuação e colocar o cuidado. “Com novas tecnologias, telessaúde e o desafio de se implementar o open health (um sistema de saúde aberta)”, garante.
Cuidado Baseado em Valor
As vantagens do Value-Based Health Care (VBHC) foram amplamente reconhecidas na última década, mas o que se discute agora é como o
modelo pode beneficiar a jornada de investimento e inovação. “Embora as organizações tenham iniciado uma ampla gama de programas-piloto com novas tecnologias nos últimos anos, esses programas ainda precisam atingir a escala e o nível de interoperabilidade que podem ter implicações revolucionárias.”
Para Pamela, o futuro acompanhará o aumento da presença de hospitais virtuais que oferecem suporte especializado abrangente, remoto, mas altamente personalizado e até preditivo. “À medida que o ecossistema de saúde inteligente evoluir, iremos ainda mais longe e veremos o surgimento de atendimento remoto especializado em larga escala, onde os médicos irão gerir efetivamente um grande número de pacientes a distância por meio de dados e tecnologia.”
A aposta é que o VBHC simplificará os modelos operacionais e introduzirá eficiência e eficácia por meio da capacidade de personalizar tratamentos. “Atualmente, muitos gastos com saúde são mal direcionados e desperdiçados porque temos poucos dados para prever quais intervenções ajudarão quais pacientes. A personalização do atendimento não é um luxo, mas um passo essencial para ampliar o acesso e a equidade em saúde”, diz Pamela Spence.
A disrupção chamada 5G
O estudo “Reimagining Industry Futures”, desenvolvido pela EY, mostra que a pandemia colocou o 5G no topo das prioridades do ecossistema global de saúde. Aplicações como o monitoramento de pacientes e a entrega de cuidados pessoais de forma virtual ganharam importância.
Luciane Infanti observa que a chegada da tecnologia 5G representa o início de uma jornada de inovação que pode trazer grandes ganhos para
todos os stakeholders, uma vez que a lógica da saúde mudará totalmente com o acesso à informação em tempo real e o monitoramento mais
preciso da população. “Até hoje, era preciso que um problema de saúde surgisse no paciente para que fosse elaborado um diagnóstico e, em seguida, o início do tratamento. A tecnologia de ponta, porém, pode antecipar esse processo e garantir um resultado muito mais eficiente”.
Já José Ronaldo Rocha, sócio da EY e líder de consultoria para Tecnologia, Mídia & Entretenimento e Telecomunicações para América do Sul, destaca que a expansão do 5G e as oportunidades para o uso de Internet das Coisas (IoT), Inteligência Artificial, wearables e ferramentas
de telemedicina viabilizam um ecossistema de saúde que utiliza dados em tempo real para detectar eventuais questões de saúde ainda em seus estágios iniciais.
Os primeiros ganhos estão ligados ao espectro mais sofisticado dos serviços de saúde, na forma de cirurgias remotas, ambulâncias e hospitais conectados. Essas soluções se beneficiam da baixa latência do 5G e da capacidade de conexão nos grandes centros. “Mas será questão de tempo para que uma infinidade de aplicações se torne realidade, proporcionando intensa transformação nos modelos e práticas de saúde”, diz Luciane.
De acordo com os especialistas, uma primeira camada de transformação está ligada aos cuidados de precisão. O entendimento dos hábitos e comportamentos dos pacientes, a partir de tecnologias e equipamentos automatizados, faz com que a coleta e análise de dados dependa menos de ferramentas de engajamento e mais da conectividade. O grande benefício dessa abordagem é a informação qualificada em tempo real, sem que pessoas que não entendam de saúde precisem inserir dados. “Isso representa uma mudança radical na maneira como o ecossistema de saúde monitora os pacientes e lida com as informações. Em vez de depender da memória do paciente ou de sua disponibilidade com equipamentos e sistemas de acompanhamento, o ecossistema passa a receber informações efetivas em tempo real”.
Essa capacidade de coleta de dados leva à segunda camada de transformação da saúde: a jornada do paciente. A tecnologia 5G quebra o tradicional ciclo sintoma/diagnóstico/tratamento e permite atender mais pessoas em um momento anterior dessa jornada, em que a possibilidade de sucesso no tratamento é muito maior. A captação de informações antes que os sintomas se manifestem aumenta a assertividade dos tratamentos a custos mais baixos.
A terceira dimensão da transformação na saúde é a das doenças crônicas e cuidados monitorados. Os avanços na conectividade criam condições para maior assistência remota e menor uso de leitos hospitalares. Essa mudança provoca impacto significativo nas estratégias públicas e privadas de saúde e nos tratamentos, gerando mais valor para a qualidade de vida das pessoas.
“A tecnologia aumentará a eficácia da saúde preventiva, cuja eficiência está ligada ao acompanhamento contínuo. E esse acompanhamento depende do engajamento do paciente, facilitado pelo 5G por meio do input de dados confiáveis em tempo real, para trazer ainda mais precisão e eficiência aos tratamentos”, concluem os especialistas.