O propósito é fornecer insights para a tomada de decisão estratégica e ações de advocacy em defesa do setor, especialmente com relação ao Projeto de Lei 2.338/2023, que regula o uso da IA no país e está em discussão no Congresso Nacional.
A pesquisa utilizou uma abordagem qualitativa com um questionário estruturado, aplicado em 30 laboratórios privados, que representam 65% de todos os exames realizados na saúde suplementar no Brasil. Segundo o documento, o uso da IA impacta mensalmente um número significativo de pacientes, variando de 10 mil a 140 mil, dependendo do porte e da capacidade dos laboratórios.
Nos procedimentos clínicos, de acordo com percepção dos entrevistados, a IA permite a melhora da experiência do paciente, com a priorização do laudo por médicos radiologistas na suspeita de casos urgentes. Para os algoritmos de IA que atuam como triagem de casos de urgência, o que faz mais sentido é o algoritmo analisar o exame assim que ele é realizado, para ganhar tempo.
Entre os principais procedimentos clínicos beneficiados pelo uso de IA estão a tomografia computadorizada (TC) de crânio para diagnóstico de acidente vascular cerebral (AVC); a ressonância magnética para análise de volumetria cerebral, identificação de escore de cálcio em TC de tórax de rotina, quantificação de gordura abdominal e idade óssea; e o raio-X de tórax. Nesses casos, algoritmos de IA são empregados para analisar imagens médicas com precisão e rapidez, auxiliando os profissionais de saúde no diagnóstico precoce e na tomada de decisões mais assertivas.
Além disso, a aplicação de processamento de linguagem natural (PLN ou, em inglês, NLP) tem sido fundamental na interpretação de laudos médicos e prontuários, automatizando tarefas de leitura e identificação de informações relevantes. Essa tecnologia também é utilizada na gestão de agendamentos, filas e liberação de resultados de exames, proporcionando uma experiência mais fluida e eficiente tanto para os pacientes quanto para os profissionais de saúde.
No âmbito administrativo e operacional, a IA tem se mostrado igualmente imprescindível. A leitura automatizada de carteirinhas de planos de saúde facilita o processo de agendamento de exames, eliminando burocracias e reduzindo o tempo de espera dos pacientes. Além disso, a aplicação de PLN na leitura de prontuários médicos contribui para a melhoria da jornada do paciente, garantindo uma comunicação mais clara e eficaz entre os diversos profissionais envolvidos no seu tratamento.
A pesquisa revelou que a maioria das tecnologias de IA utilizadas é desenvolvida por terceiros (80%), enquanto apenas 20% são desenvolvidas internamente, em geral por grandes laboratórios. Os fornecedores de IA são tanto nacionais quanto internacionais, com uma ligeira predominância de empresas multinacionais.
Principais procedimentos que possuem o uso de IA
Segundo o documento, é necessária uma abordagem regulatória principiológica para o uso da IA na saúde, respeitando princípios como transparência, justiça, equidade e responsabilidade. É crucial o diálogo entre o setor da saúde e as agências regulatórias para estabelecer normativas que garantam a segurança e a eficácia da IA.
Também é destacada a necessidade de regulamentação específica para garantir a qualidade e a segurança dos procedimentos assistenciais que utilizam IA, enquanto se defende a autonomia do profissional de saúde na tomada de decisão.
“As evidências apresentadas na pesquisa servem como contribuição, por exemplo, para que o PL 2338/2023 seja alterado profundamente, especialmente no que diz respeito ao enquadramento das aplicações de IA no setor da saúde como sendo de alto risco, independente dos dados que são utilizados e a sua área de atuação, já que existe uma vasta possibilidade de utilização no campo administrativo e operacional”, destaca Milva Pagano, diretora-executiva da Abramed.
Questionamentos técnicos dos laboratórios clínicos
Adicionalmente às contribuições do setor de medicina diagnóstica na construção do PL para regularização do uso da IA no Brasil, e levando em consideração que a aplicação da IA ainda está em fase inicial no país, faz-se necessário um amplo debate sobre boas práticas de implantação de um modelo de IA em laboratório clínico, seja para questões operacionais ou de diagnóstico.
O uso desses modelos em medicina laboratorial tem muitos desafios, particularmente aqueles associados às etapas de desenvolvimento e validação. Em estudo recente do IFCC Working Group, são descritas recomendações para a implantação de um modelo de IA no laboratório. Outras referências internacionais atuais também contribuem para o tema ao apresentarem checklists específicos com os itens mínimos para condução de uma metodologia de desenvolvimento e validação de modelos de IA que garantam confiabilidade e reprodutibilidade de resultados clinicamente significativos. Já há uma ISO específica para IA.
De acordo como o estudo da Abramed, o registro dessa validação precisa ser feito alinhado às normas técnicas e não apenas às questões de tecnologia. Surgem cada vez mais questionamentos sobre validação de tecnologia com olhar clínico-médico: como isso se relaciona à segurança do paciente e à árvore de decisão clínica? Que referências foram empregadas para “aprovar” sua incorporação à rotina?
A acurácia de um algoritmo não é suficiente para mensurar qualidade e segurança clínica e definirmos a validação técnico-médica. É importante avaliar se a aplicação de IA no laboratório será no contexto de dispositivo médico, solução técnica ou apoio a decisão. Qual é a inserção da IA no workflow laboratorial? Qual será a referência técnica (guideline) de suporte para a sua adoção? Quem será o “responsável” por sua validação para prática laboratorial?
Por fim, existem as questões técnicas específicas do desenvolvimento do algoritmo relacionadas à qualidade da distribuição, composição e representatividade dos dados, assim como análise de bias. Nesse sentido, é preciso conectar as referências e trazer o olhar da ciência aplicada e da segurança do paciente para a formatação final do uso dessas aplicações na medicina.
Acesse a pesquisa completa em:
www.abramed.org.br/publicacoes